A interação entre Lean e BIM

Os princípios Lean e a metodologia BIM são diferentes iniciativas, entretanto ambas estão a causar mudanças fundamentais na construção civil. A primeira, como uma abordagem que prima pela eliminação dos desperdícios, e a segunda como fundação para a transformação digital e gestão da informação na indústria da Arquitetura, Engenharia e Construção (AEC).

Enquanto os dois são conceitualmente independentes, há uma sinergia entre eles que vai além da natureza circunstancial do contexto de mercado e de transformação digital em que se encontram.

Lean

O conceito de produção enxuta refere-se à aplicação e adaptação dos princípios subjacentes do Sistema Toyota de Produção TPS à construção.

Após a Segunda Guerra Mundial, a grande crise económica no Japão levou Eiji Toyota e Taiichi Ohno chegarem à conclusão de que a forma de produção em massa não tinha êxito, e assim desenvolveram a produção enxuta com o objetivo de combater os desperdícios, adotando a excelência operacional e a relação harmônica entre processos x pessoas x produtos.

Podemos sintetizar alguns dos principais objetivos do Lean:

  • Reduzir a variabilidade: obter qualidade à primeira
  • Reduzir o fluxo de tempo
  • Flexibilidade
  • Controle da Produção
  • Padronização
  • Melhoria contínua
  • Gestão Visual
  • Desenvolvimento de mapas de fluxos de valor
  • Clareza nos requisitos
  • Foco no conceito da solução
  • Verificar e validar

BIM

A metodologia BIM oferece uma nova abordagem para o projeto, construção e operação onde a representação digital do projeto e processo de construção é utilizada para facilitar a troca e interoperabilidade de informações em formato digital.

De acordo com o BIM Handbook (Eastman, 2008), BIM é definido como “um verbo ou frase adjetiva para descrever ferramentas, processos e tecnologias que são facilitadas por dispositivos digitais, para gerir a informação e documentação sobre um edifício, o seu desempenho, o seu planeamento, a sua construção e, posteriormente, a sua operação”. O resultado da atividade BIM é um “modelo de informação de construção”.

O BIM oferece uma base para as novas necessidades da indústria da construção e para a mudança das responsabilidades e relacionamentos entre os integrantes das diversas equipas para o empreendimento de um edifício. Além disso, é um facilitador no processo de projeto e construção mais integrado resultando em edifícios de melhor qualidade, menor custo e duração do projeto.

Alguns das características e benefícios do BIM são:

  • Desenvolvimento de um modelo 3D de informação
  • Permite a rápida produção de diferentes alternativas de design
  • Análise de dados
  • Integração entre informação e projeto
  • Automação de processos e verificação de erros
  • Automação na geração de documentos da construção
  • Colaboração entre design e construção
  • Rápida avaliação e desenvolvimento de planeamentos para a obra
  • Comunicação com base online

Lean Construction

O BIM possui diferentes níveis de maturidade, estes níveis referem-se à forma pela qual os tipos específicos de dados são vinculados a um modelo de informação. Os níveis de maturidade do nível 0, até os níveis 1, 2, 3 e além, referem-se ao grau de colaboração existente num projeto.

Essas dimensões aprimoram os dados associados a um modelo para compartilhar um maior nível de entendimento de um projeto de construção. Neste contexto, a 9ª dimensão, BIM 9D abrange o Lean Construction.

Esta metodologia de trabalho é utilizada para a conclusão efetiva do processo BIM como parte da estrutura de produção no setor de construção e o uso da digitalização.

O BIM 9D, é a dimensão do BIM que otimiza e agiliza todas as etapas necessárias à realização de uma obra, através da digitalização de seus processos.

A falta de planeamento numa obra pode, de facto, levar a atrasos na entrega e aumentar o valor inicialmente orçamentado. O BIM 9D é o método concebido para eliminar desperdícios, minimizar os resíduos produzidos num estaleiro, otimizar todos os recursos envolvidos no processo de execução de uma obra e aumentar a produtividade.

Todos esses aspetos contribuem para a criação de um produto final sustentável.

Lean & BIM

O Lean e o BIM não são dependentes um do outro. No entanto, ambos atuam na implementação de ferramentas e desenvolvimento de processos com um fim específico. A 9ª dimensão BIM já integra princípios de redução de desperdícios nos processos de uma construção, mas neste artigo propõe-se estender esta análise sobre como uma mentalidade Lean pode auxiliar no planeamento de processos BIM desde os primeiros níveis de maturidade (3D, 4D, …) e como ferramentas BIM podem ser catalisadoras para o sucesso da implementação dos princípios da construção enxuta.

Quando pensamos sobre a transformação Lean de uma empresa, é muito diferente da implementação das ferramentas Lean como um fim. Em muitas organizações é comum verificar que o preenchimento de documentos para cumprir com a norma é o fim em si, em vez do importante para a organização, que é ter um sistema que promova o correto funcionamento dos processos da empresa, a melhoria contínua e no final os resultados esperados pela estratégia definida.

Algo muito similar também se pode perceber com a implementação do BIM numa empresa. Muitas vezes, ainda se acredita que apenas adotar programas como o Revit e criar modelos 3D é adotar o BIM, ou mesmo seguir as Normas e preencher os documentos padrão, sem avaliar os processos que irão gerir a informação, as responsabilidades de cada integrante, o planeamento e fluxo de tarefas para a concretização do produto final.

                  A transformação Lean & BIM são uma mudança na forma de pensar, atuando diretamente nos processos e no desenvolvimento das pessoas para terem atitudes colaborativas, pragmáticas e focadas na solução.

OS SETE DESPERDÍCIOS

                  De acordo com o Lean Manufacturing, desperdício pode ser descrito como “algo que não agrega valor na visão do cliente”. Eliminar a realização de atividades desnecessárias é uma excelente maneira de reduzir o tempo necessário para concluir um produto final. Além disso, a melhor forma de melhorar os lucros é reduzir custos, isso significa remover todos os elementos de desperdícios do seus processos.

                  Outro ponto importante que a eliminação de desperdícios pode gerar é o aumento de satisfação do seu cliente com os seus produtos ou serviços, ou seja, quando um produto é entregue no tempo estimado, como alto padrão de qualidade e ao preço certo, o que gera grande chance de fidelização.

                  Quem trabalha com o BIM, já deve ter pensado ou percebido que muitas vezes a rapidez esperada, a fluidez nos processos e nos automatismos podem não funcionar como o esperado. Numa implementação BIM, sem uma mudança de mentalidade de pessoas x processos x produtos, pode-se cometer o erro de colocar muita ênfase em soluções que focam principalmente em questões periféricas, como sistemas de planeamento de recursos empresariais, em vez de processos centrais de equipas. Pessoas, processos e tecnologias devem ser abordadas com importância central.

                  Neste sentido, aplicar os conceitos dos sete desperdícios do Lean, podem ser uma boa abordagem ao iniciar um processo BIM ou o planeamento de um modelo de informação.

Desperdícios Lean Desperdícios BIM
Produção em excesso Modelação em excesso
Espera Espera por decisões
Processos/ Tarefas desnecessárias Escopo mal definido
Movimentação Informação dispersa
Correção Retrabalho

                  Ao iniciar um planeamento de um modelo de informação e de todo o fluxo de trabalho entre as equipas envolvidas, uma pergunta essencial a ser feita é: Qual é o objetivo? A definição específica e detalhada do objeto de trabalho é essencial para o planeamento de todas as atividades e de como chegaremos ao produto final através de uma boa comunicação entre arquitetos, engenheiros, construtores e donos de obra. Cada disciplina precisa ter clareza sobre todos os elementos que serão modelados, a partir do conhecimento do seu uso final.

Além disso, as estratégias e prioridades de modelação entre as especialidades são essenciais para a compatibilização do projeto. Se cada disciplina projetar e modelar o seu projeto separadamente, ao final do processo, ferramentas de automação e deteção de colisões não conseguem resolver problemas primários de projeto.

         Outro desperdício comum é a espera por decisões, esperar por pessoas, entregas de modelos, decisões, aprovações, podem travar o processo e acima de tudo gerar retrabalho.

Estes são alguns dos exemplos, de como podemos aplicar conceitos de uma metodologia para aprimorar a obtenção de resultados.

A interação dos princípios Lean e BIM na construção devem ser vistos como um processo completo, em vez da soma das partes isoladas. Cada etapa de um processo BIM suporta vários princípios Lean e vice-versa e, consequentemente, estes criam um efeito sinérgico. Pela mesma razão, o raciocínio de apenas um técnico não pode determinar todas as interações e os seus impactos, porque é a partir do teste e da experimentação que conseguimos perceber na prática os acertos e erros.

No contexto atual do mercado da construção, tanto para o BIM quanto para o Lean, é provável que os níveis de implementação dentro da maioria das empresas e profissionais ainda estejam em processo de aprendizagem. Por isso, uma adoção baseada em prática e pequenos passos pode ser uma boa estratégia para resultados mais efetivos e menos teóricos.

A amplitude e a profundidade das interconexões implicam que qualquer empresa ou projeto em uma jornada Lean deve considerar seriamente o uso do BIM para melhorar os resultados Lean. Por outro lado, qualquer empresa ou projeto que implemente o BIM deve garantir que o seu processo de adoção/mudança esteja contribuindo para, na medida do possível, tornar os seus processos mais enxutos.

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